Primeiro semestre encerra com vitórias tributárias expressivas da União nas cortes
Mais uma vez, os leading cases tributários tiveram protagonismo nas pautas das Cortes Superiores no primeiro semestre de 2023. E, dessa vez, com uma atuação escorreita da União frente aos tribunais, resultando numa sequência de êxitos em ações bilionárias.
Em fevereiro, a União se sagrou vencedora no julgamento da chamada “coisa julgada”, no RE 949.297 e RE 955.227, Temas 881 e 885 da repercussão geral. Na ocasião, o STF (Supremo Tribunal Federal) decidiu, por unanimidade, que o contribuinte que obteve decisão judicial favorável com trânsito em julgado permitindo o não pagamento de um tributo, perderá automaticamente seu direito quando a Corte proferir novo entendimento considerando a cobrança constitucional.
A vitória da Fazenda no Supremo ocasionou uma perda expressiva ao cofre de diversas empresas, a exemplo da Samarco, que calculou, em seu Relatório de Demonstração Financeira do ano de 2020 [1] um risco possível de perda de aproximadamente R$ 5,8 bilhões.
Até o momento, as empresas fizeram a oposição de embargos de declaração a fim de que a Suprema Corte se debruce, uma vez mais, sobre a modulação dos efeitos, ao argumento de que há nítida omissão em relação à jurisprudência firmada por anos pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), em caráter repetitivo (Tema 340).
Apesar do mês de março não ter sido marcado por vitórias expressivas, a pauta de julgamentos do STJ de abril foi repleta de casos significativos para os cofres públicos.
O que merece maior destaque é o julgamento repetitivo do Tema 1182/STJ, em que os ministros da 1ª Seção decidiram, por unanimidade, que os benefícios fiscais de ICMS (redução de alíquota, isenção e diferimento) compõem a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, exceto nas situações em que os contribuintes cumprem as regras do artigo 10 da Lei Complementar n° 160/2017 e artigo 30 da Lei n° 12.973/14.
A decisão do julgamento foi bastante comemorada pelo ministro da Fazenda, Fernando Haddad, que despachou pessoalmente com o relator do caso, ministro Benedito Gonçalves. Ele ainda afirmou, publicamente, que a decisão foi “exemplar” e que permitirá uma arrecadação de R$ 90 bilhões aos cofres públicos.
Aqui, a discussão judicial também não finalizou. Os contribuintes realizaram a oposição de Embargos de Declaração requerendo, basicamente, que se esclareça 1) omissão, quanto ao ponto três da tese fixada, que dá margem de entendimento para que a Receita Federal consiga autuar as empresas ao verificar que o benefício concedido foi utilizado para “finalidade estranha à garantia da viabilidade do empreendimento econômico”; e que seja realizada a 2) modulação dos efeitos da decisão, aplicando efeitos prospectivos. Contudo, em relação ao segundo pedido, as chances são remotas, uma vez que a Corte Superior não possui a cultura de utilização do instituto da modulação.
Em maio, o STF finalizou o julgamento da ADC 84, em que foi referendada a liminar do ministro Ricardo Lewandowski, que suspendeu todas as decisões judiciais e administrativas que derrubaram o Decreto 11.374/23, editado já no governo do atual presidente Lula, que restabelecia as alíquotas de PIS e Cofins em 0,65% e 4%, respectivamente.
Segundo a Advocacia Geral da União (AGU), caso a Suprema Corte decidisse por manter o decreto assinado no penúltimo dia do governo passado, pelo então presidente em exercício Hamilton Mourão (Jair Bolsonaro já estava em Miami), isso implicaria numa redução de mais de R$ 5 bilhões na arrecadação da União no ano de 2023.
Ainda em maio, houve também grande vitória da Fazenda no STJ em sede de repetitivo. Por maioria de votos, os ministros da 1ª Seção decidiram, no julgamento do Tema 1.008, que o ICMS integra a base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados no regime do lucro presumido.
A derrota aqui atinge milhares de contribuintes, cujo faturamento da empresa seja de até R$ 78 milhões.
Para fechar o semestre, o STF validou, por 7 a 1, a cobrança de PIS e Cofins sobre as receitas financeiras dos bancos antes da Lei n° 12.973/2014 (Tema 372). Com o julgamento favorável aos seus interesses, a União evitou uma perda de mais de R$ 110 bilhões calculado em cinco anos, conforme apontado pelo Projeto de Lei de Diretrizes Orçamentárias (PLDO) do ano de 2024 [2].
Os casos citados representam que a estratégia adotada pela Fazenda Nacional, de atuar incisivamente junto aos gabinetes dos ministros do STF e STJ em casos estratégicos, tem rendido bons frutos. No primeiro semestre de 2023, a somatória das vitórias gera um impacto de mais de R$ 150 bilhões aos cofres públicos.
Tal postura foi iniciada com a publicação do Decreto n° 11.379, em 13 de janeiro de 2023 [3], em que o governo criou o Conselho de Acompanhamento e Monitoramento de Riscos Fiscais Judiciais na AGU, com o intuito de propor medidas de aprimoramento da governança de riscos fiscais judiciais da União, de suas autarquias e fundações.
A palavra de consolo aos contribuintes e empresas que vêm sentindo o grande impacto negativo das decisões citadas é que o ano começou sob novo governo, o que, por si só, sensibiliza as Cortes Superiores ao decidir teses com grande impacto arrecadatório.
No momento, não há como prever se o cenário de grandes vitórias da Fazenda permanecerá ou não no segundo semestre de 2023. O que nos resta, por ora, é aguardar atentamente as cenas dos próximos capítulos.
[1] Acesso em 28/06/2023: https://www.samarco.com/wp-content/uploads/2022/04/1649162855_577e4d_samarco_relatoriodemonstracoesfinanceiras_2903_1-1.pdf.
[2] Acesso em 29/06/2023: https://legis.senado.leg.br/sdleg-getter/documento?dm=9322179&ts=1686836431300&disposition=inline.
[3] Acesso em 29/06/2023: http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2023-2026/2023/decreto/D11379.htm.
Allana Rayssa Souza Alarcon é advogada no Castro Barros Advogados em Brasília e pós-graduanda em Direito Tributário pelo Instituto Brasileiro de Ensino, Desenvolvimento e Pesquisa (IDP).
https://www.conjur.com.br/2023-jul-04/allana-alarcon-vitorias-tributarias-expressivas-uniao