Tributário

STF considera inconstitucional a exigência de cadastro de ISS por contribuinte não estabelecido no respectivo Município e a imposição de retenção pelo tomador

STF considera inconstitucional a exigência de cadastro de ISS por contribuinte não estabelecido no respectivo Município e a imposição de retenção pelo tomador

Na última sexta-feira (26.02.2021), o Tribunal Pleno do Supremo Tribunal Federal (STF), por maioria, deu provimento ao Recurso Extraordinário (RE) nº 1167509 (Tema nº 1.020), para declarar que é incompatível com a Constituição Federal disposição normativa que prevê a obrigatoriedade de cadastro, em órgão da Administração municipal, de prestador de serviços não estabelecido no território do respectivo Município e a imposição ao tomador da retenção do Imposto Sobre Serviços (ISS) quando descumprida a obrigação acessória.

O caso analisado trata do artigo 9º-A, caput e §2º, da Lei nº 13.701/2003, com redação dada pela Lei nº 14.042/2005, editadas pelo Município de São Paulo, que dispõe que o prestador de serviço que emitir nota fiscal autorizada por outro Município, para tomador estabelecido no Município de São Paulo, fica obrigado a proceder à sua inscrição em cadastro da Secretaria Municipal de Finanças. Além disso, determina que as pessoas jurídicas estabelecidas no Município de São Paulo, ainda que imunes ou isentas, são responsáveis pelo pagamento do ISS, devendo reter na fonte o seu valor, quando tomarem ou intermediarem determinados serviços executados por prestadores de serviços não inscritos em cadastro da Secretaria Municipal de Finanças e que emitirem nota fiscal autorizada por outro Município.

Nesses termos, o Município de São Paulo, com o objetivo de afastar a evasão fiscal, estabeleceu obrigação – cadastramento – a contribuinte submetido à imposição tributária de outra municipalidade. A inscrição no aludido cadastro, então, tornou-se uma obrigação acessória, cuja consequência pela falta de cumprimento implicou na obrigatoriedade de retenção do ISS pelo tomador de serviço, ainda que o imposto, conforme as regras de local da prestação, fosse devido ao Município onde está localizado o prestador.

O recurso extraordinário em questão foi interposto pelo Sindicato de Empresas de Processamentos de Dados e Serviços de Informática do Estado de São Paulo (SEPROSP) contra acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP), o qual manteve a obrigação de cadastro na Secretaria Municipal de Finanças em sede de apelação em mandado de segurança coletivo, tendo como principais argumentos:

(i) que a retenção do ISS pelo tomador de serviço acaba por onerá-lo duplamente;
(ii) a incompetência municipal para eleger, como responsáveis tributários, tomadores de serviços cujos prestadores estejam fora do respectivo território, uma vez que apenas lei complementar poderia tratar de normas gerais de direito tributário;
(iii) ofensa aos artigos 30, inciso I, 146 e 152 da Constituição Federal e ao princípio da territorialidade, considerando a cobrança sobre fatos estranhos à competência tributária do município de São Paulo.

Muito embora a Procuradoria-Geral da República tenha manifestado parecer pela constitucionalidade da norma, o relator do caso, Ministro Marco Aurélio, expôs que:

(i) Descabe potencializar a finalidade fiscalizatória do cadastro, permitindo-se, à margem da Constituição Federal, à margem da Lei Complementar disciplinadora – nº 116/2003 –, a criação de encargos por quem não integra a relação jurídica tributária;
(ii) A disciplina versada na norma é estranha ao interesse local, configurando ofensa ao disposto no artigo 30, inciso I, da Lei Maior;
(iii) Mostra-se configurada a arguida afronta ao artigo 152 da Carta da República. A medida impugnada dá ensejo a tratamento diferenciado em razão da procedência do serviço, ante o regime peculiar inaugurado visando estabelecimentos situados fora do Município;
(iv) Ao imputar ao tomador do serviço a retenção do ISS uma vez descumprida, pelo prestador, a obrigação acessória, a Lei local nº 14.042 /2005, a par de usurpar competência tributária alheia, discrepa, a mais não poder, das balizas formais delineadas na Constituição de 1988;
(v) A norma, ao estipular a “penalidade” de retenção do ISS pelo tomador dos serviços, nos casos em que o prestador, situado em outro Município, não observar a obrigação acessória de cadastramento na Secretaria Municipal, opera verdadeira modificação do critério espacial e da sujeição passiva do tributo, revelando duas impropriedades formais: a usurpação da competência legislativa da União, a quem cabe editar a norma geral nacional sobre a matéria, e a inadequação do móvel legislativo, considerada a exigência constitucional de veiculação por lei complementar;
(vi) A sistemática descrita na norma do Município de São Paulo, ao passo que imputa ao tomador a retenção do tributo a ser recolhido, discrepando do versado na lei de regência do ISS, conduz à imprecisão na identificação do sujeito ativo da obrigação tributária, revelando inobservância ao princípio da tipicidade, corolário da legalidade tributária.

Dessa forma, conforme os argumentos supracitados, o Ministro declarou a incompatibilidade da norma com a Constituição Federal, tendo sido seguido pelos Ministros Edson Fachin, Ricardo Lewandowski, Gilmar Mendes, Rosa Weber, Luiz Fux, Nunes Marques e Luís Roberto Barroso acompanharam o voto do relator. Foram vencidos os Ministros Alexandre de Moraes, Cármen Lúcia e Dias Toffoli.

 Por fim, sobre o tema, é importante ressaltar que este julgamento do STF alterou o entendimento da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ), que é favorável aos Municípios que exigem o referido cadastro, por meio do AgRg no Recurso Especial nº 1.140.354/SP, julgado em 11.05.2010. Isso porque, no entendimento do STJ, o interesse público na arrecadação e na fiscalização tributária legitima o ente federado a instituir obrigações, aos contribuintes, que tenham por objeto prestações, positivas ou negativas, que visem guarnecer o fisco do maior número de informações possíveis acerca do universo das atividades desenvolvidas pelos sujeitos passivos.

Os profissionais do Departamento Tributário do Castro Barros estão à disposição para prestar maiores esclarecimentos sobre o tema.