Direito Público, Infraestrutura e Regulatório
Broadcast Energia

COLUNA LEGAL: ANEEL E O TERMO ADITIVO PARA RENOVAÇÃO DE 30 ANOS DAS DISTRIBUIDORAS DE ENERGIA

Um dos sinais de maturidade institucional de um país está diretamente relacionado ao conceito de segurança jurídica. Contratos de longo prazo são sempre desafiadores, especialmente em setores estratégicos, como o de distribuição de energia elétrica.
Soma-se a isso o fato de que os contratos de concessão de distribuição de energia elétrica foram alguns dos primeiros a serem assinados quando, no final da década de 1990, se iniciou uma nova fase de concessões no Brasil.
Ao longo dessas três décadas, muitas lições foram aprendidas, houve um amadurecimento regulatório crescente e a formação de um mercado robusto e competitivo. Os desafios atuais são profundamente diferentes dos enfrentados há mais de 30 anos, o que exige uma adaptação às novas realidades, sem perder o conhecimento acumulado.
Diante desse cenário, é bastante positivo o anúncio da Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) sobre a aprovação do termo aditivo aos contratos de concessão do serviço público de distribuição de energia elétrica, que estão prestes a expirar. Este termo aditivo visa formalizar a prorrogação dos contratos de 19 distribuidoras de energia por um período adicional de 30 anos, com vigência a partir do término dos contratos atuais, cuja expiração está prevista entre 2025 e 2031.
Esta iniciativa reflete a necessidade de modernizar a infraestrutura do setor elétrico, garantindo melhorias significativas tanto na qualidade do serviço quanto na experiência do consumidor. De acordo com as informações publicadas pela Aneel, o principal objetivo do termo aditivo aprovado é ajustar e modernizar cláusulas essenciais, com ênfase na melhoria da satisfação dos consumidores e da qualidade do serviço prestado.
Além disso, o termo aditivo deve propor medidas para aumentar a resiliência das redes de distribuição diante de eventos climáticos severos – como os que têm ocorrido em São Paulo – e reforça o compromisso das distribuidoras com a sustentabilidade econômico-financeira da concessão. Entre os pontos mais relevantes, destacam-se a introdução de novas modalidades tarifárias, que proporcionam mais opções aos consumidores, e o desenvolvimento de um plano diferenciado para o tratamento das perdas não técnicas, especialmente nas Áreas de Severas Restrições Operativas (ASRO).
Um ponto importante que está na pauta do termo aditivo é o compromisso das distribuidoras com a sustentabilidade financeira, exigindo que mantenham níveis adequados de geração de caixa e endividamento. Isso é crucial para garantir que as distribuidoras possam realizar os investimentos necessários para melhorar a qualidade do serviço. O não cumprimento dessas exigências pode resultar em restrições, como a limitação na distribuição de dividendos ou até mesmo a caducidade da concessão.
Outro ponto de destaque é que a Aneel terá maior poder para definir metas objetivas de satisfação do consumidor, que impactarão diretamente na formação das tarifas.
Caso os consumidores estejam insatisfeitos de maneira sistemática com o serviço prestado, poderá ser determinada a troca da distribuidora. Além disso, a participação dos consumidores no desenvolvimento do Plano de Ação das distribuidoras será garantida por meio de consultas realizadas a cada ciclo tarifário.
Com o objetivo de melhorar a qualidade do serviço, especialmente em áreas rurais e de menor densidade urbana, os novos contratos exigem não só o cumprimento dos indicadores de continuidade, como também a adoção de metas de eficiência na recomposição do serviço após interrupções causadas por eventos climáticos severos.
Um ponto crucial do termo aditivo diz respeito à modernização das tarifas, prevendo a introdução de estruturas tarifárias mais modernas, que oferecem mais opções para os consumidores, como tarifas diferenciadas por horário e para veículos elétricos, além de modalidades como tarifas pré-pagas e cashback. Essa flexibilidade tem como objetivo otimizar a capacidade instalada de geração, transmissão e distribuição de energia.
A modernização e a expansão do sistema de distribuição são pilares dos novos contratos e precisam estar em consonância com o momento de transição energética global em que o Brasil pode – e deve – ser protagonista na arena global. As distribuidoras devem planejar a ampliação do sistema de distribuição considerando o critério de menor custo global, além de explorar alternativas como integração com outros sistemas de transmissão e uso de recursos energéticos distribuídos.
Nas distribuidoras que atendem áreas com severas restrições operativas, a Aneel terá um papel importante e deverá trabalhar em conjunto com a sociedade para desenvolver um plano diferenciado de combate às perdas. Essa medida visa melhorar a qualidade do serviço em regiões com grandes desafios operacionais, como é o caso dos famosos “gatos”, que são responsáveis por boa parte da perda de energia em centros urbanos.
Após um debate bastante intenso com o setor, o termo aditivo deve incluir uma cláusula que limita as distribuidoras à renúncia de ações judiciais, restringindo os questionamentos apenas às cláusulas do próprio termo e às condições estabelecidas no Decreto nº 12.068, de 2025, referente à prorrogação dos contratos de concessão de distribuição de energia elétrica. Além disso, a Aneel propôs que o Ministério de Minas e Energia (MME) exija o pagamento de multas aplicadas às distribuidoras, atualmente suspensas por decisões judiciais, como forma de aumentar o poder de fiscalização da agência e beneficiar os consumidores com a redução de custos da Conta de Desenvolvimento Energético (CDE).
Os próximos passos incluem a publicação da minuta do termo aditivo, seguida pela apresentação do pedido de antecipação da renovação por parte das distribuidoras.
Após a análise dos indicadores técnicos e econômico-financeiros, a Aneel encaminhará sua recomendação ao MME, que terá 30 dias para decidir sobre a assinatura do contrato. Após essa decisão, as distribuidoras terão 60 dias para assinar os aditivos aos novos contratos de concessão.
A renovação dos contratos de concessão das distribuidoras de energia elétrica pela Aneel representa um marco importante para o setor, com foco na modernização da infraestrutura, melhoria na qualidade do serviço e maior transparência nas relações com os consumidores. As novas cláusulas introduzidas visam tornar o setor mais eficiente e sustentável, enfrentando desafios como as mudanças climáticas e a expansão de novas tecnologias energéticas. A implementação dessas mudanças deverá ser acompanhada de perto, com a expectativa de benefícios diretos para os consumidores e para o setor como um todo.

*Paulo Henrique Spirandeli Dantas é advogado especializado em Infraestrutura e Direito Administrativo do escritório Castro Barros Advogados e escreve periodicamente para a Coluna Legal, do Broadcast Energia.