Direito Público, Infraestrutura e Regulatório
Valor Econômico

Custos médios do frete iniciam o ano em curva ascendente

Preços do diesel tendem a pressionar o transporte de mercadorias no país em 2024, a despeito da previsão de menor movimentação de cargas no agronegócio

Depois de oito meses de baixas em sequência, os custos médios do frete iniciaram o ano em ligeira elevação, sugerindo uma tendência de alta em 2024, na avaliação de Vinicios Fernandes, diretor da Edenred Repom. Segundo o Índice de Frete Edenred Repom (IFR), apurado com base em oito milhões de transações de frete e vale-pedágio, o preço médio por km rodado avançou de R$ 6,22 em dezembro para R$ 6,36 em janeiro, mantendo-se ainda 10% abaixo dos níveis observados no primeiro mês de 2023. Os dados das primeiras semanas de fevereiro sinalizam novo aumento, diz Federico Vega, CEO da frete.com.

A atualização dos pisos mínimos de frete em 19 de janeiro pela Agência Nacional de Transportes Terrestres (ANTT), numa correção que variou de 1,03% a 5,66% a depender do tipo de veículo, da carga e do trajeto, “refletiu diretamente no aumento do custo de transporte”, diz Fernandes. Ainda em janeiro, foi retomada a cobrança do PIS/Cofins sobre combustíveis, seguida, em fevereiro, pelo aumento do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços (ICMS) no mesmo setor. “O diesel deve ser o fiel da balança do custo do frete no país em 2024”, afirma Renan Rimes, gerente da Deloitte para as áreas de supply chain e logística, antecipando uma tendência de elevação ao longo do ano, ainda que a movimentação de grãos, setor que exerce maior influência no comportamento dos preços, tenda a ser menor do que em 2023.

Vega pondera que o repasse das altas do diesel para o frete, segundo estudos internos da frete.com, nem sempre é integral e não ocorre de forma imediata. “Ele demora cerca de sete dias, além do que, em média, o repasse do aumento do preço do diesel para o aumento do preço do frete é de apenas 57%.” Para Rimes, só o aumento do ICMS tende a determinar alta entre R$ 0,15 e R$ 0,25 sobre o litro do diesel, correspondendo a aumentos entre 5% e 10% no preço do combustível.

Segundo Elisangela Pereira Lopes, assessora técnica da comissão de logística e infraestrutura da Confederação da Agricultura e Pecuária do Brasil (CNA), o atraso na colheita da safra 2023/24 e a lentidão maior na venda de grãos, a perspectiva de uma quebra em torno de 20 milhões de toneladas na safra e a redução nos preços da soja e do milho, em princípio, deveriam trazer algum alívio nos custos de transporte. “O setor é um termômetro para os transportadores autônomos e, entre o fim de 2023 e esses primeiros meses de 2024, também ditou um efeito contrário da demanda”, diz Alan Medeiros, assessor institucional da Confederação Nacional dos Transportadores Autônomos (CNTA).

Em janeiro deste ano, diz Lopes, o frete chegou a ceder em Mato Grosso, Goiás e na região do Matopiba (Maranhão, Tocantins, Piauí e Bahia), com o atraso no escoamento da safra. “Em Mato Grosso, na rota para Santos, registrou-se queda de 4% a 7%. Mas o cenário tende a mudar em março e abril, com o pico da safra.” A tendência tem sido inversa no Arco Norte, com os preços médios do frete agrícola subindo de R$ 330 para R$ 340 entre dezembro de 2023 e janeiro deste ano, por conta da normalização da rota, afetada pela seca na região Norte, que atingiu seu auge em outubro de 2023.

Num setor que movimenta anualmente mais de R$ 300 bilhões, segundo Fernandes, a demanda por fretes tende a avançar neste ano, com desempenho menos vigoroso, mas ainda satisfatório para o agronegócio, e crescimento para os setores cimenteiro e siderúrgico, “por conta dos investimentos no setor da construção civil e infraestrutura”. Adicionalmente, diz Fernandes, “espera-se a retomada da indústria de transformação e de bens de consumo”.

A frete.com, afirma Vega, anotou em sua plataforma dez milhões de fretes em 2023, com 200 mil carregamentos a mais transportados em relação a 2022, e incremento de 18% nos fretes em janeiro deste ano ante o mesmo mês de 2023. O agronegócio respondeu por 41% das cargas, ampliando em 16% os volumes transportados no ano passado, com quedas para a movimentação de produtos industrializados e insumos para a construção, que responderam, pela ordem, por 24% e 13% do volume de frete negociado pela plataforma. Para este ano, Vega avalia que o desempenho tende a ser o inverso, com algum recuo para o agronegócio e avanço para produtos industrializados e construção.

A qualidade das rodovias, que concentram quase dois terços do transporte de cargas no país, igualmente afeta o custo logístico, encarecendo a manutenção de veículos, elevando o consumo de combustível e gerando quebra de caminhões e o desgaste de equipamentos, peças e pneus. Para Lopes, a má qualidade das estradas foi um dos fatores por trás da alta de 32,7% nos custos operacionais do transporte de cargas no ano passado, segundo a Confederação Nacional do Transporte (CNT). “Sabemos o que precisa ser feito para equalizar a matriz de transporte e reduzir o uso de caminhões, limitando suas rotas a no máximo 500 km. É importante ter um programa de renovação da frota, que tem idade média de quase 23 anos no caso dos transportadores autônomos, assim como estimular fontes alternativas e renováveis de combustíveis”, afirma ela. “Mas precisamos incentivar outros modais, como a cabotagem, potencializando o uso de 8,5 mil km de costa marítima.”

Nos demais setores da economia, diz Rimes, os preços do frete tendem à estabilidade, mas devem seguir algum crescimento “natural”, acompanhando a inflação. Numa estimativa da Deloitte, o valor do frete de transferência entre as indústrias e centros de distribuição e na chamada “última milha”, até o cliente final, em geral tem um peso entre 4% e 5% na estrutura de custos do setor industrial.

Para o setor, a redução dos custos logísticos no país exigirá investimentos mais robustos em infraestrutura. Mas é preciso haver coordenação institucional, exercida por um organismo federal, que permita a integração dos diversos modais, com capacidade para “pensar a logística no curto, médio e longo prazos”, defende Paulo Dantas, sócio do escritório Castro Barros Advogados e vice-presidente do comitê de infraestrutura da Câmara Britânica de Comércio e Indústria do Brasil (Britcham). O Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES), diz ele, tem um papel importante a exercer no fomento, desenvolvimento de projetos e financiamento do setor.

Levantamento da consultoria Inter.B projeta investimentos de R$ 215,48 bilhões em projetos de infraestrutura neste ano, próximo de 1,87% do Produto Interno Bruto (PIB) e cerca de 11% acima dos valores de 2023, na faixa de R$ 194,45 bilhões. Ainda na estimativa da Inter.B, o país deveria investir em torno de 4% do PIB para modernizar e manter sua infraestrutura atualizada. Segundo Rimes, entre projetos rodoviários e ferroviários, o Arco Norte deverá receber investimentos de R$ 2,6 bilhões neste ano e o Arco Sul, pouco mais de R$ 2 bilhões, considerando apenas recursos públicos.

Há cinco anos no mercado, a Magis5, ferramenta de integração e automação dedicada a marketplaces e lojas on-line, espera dobrar de tamanho neste ano, superando a marca de cem milhões de pedidos e movimentando em torno de R$ 10 bilhões, de acordo com o CEO da empresa, Cláudio Dias. “As vendas estão bem aquecidas neste ano e há aumento na demanda por fretes. Nossa expectativa é que o mercado cresça de forma significativa nos próximos anos, especialmente em razão da baixa dos juros, o que impacta diretamente o consumo das pessoas.”

O diferencial dos custos de frete entre as regiões e, especialmente, o maior tempo de entrega de encomendas no Norte e no Nordeste ainda são um desafio para o comércio eletrônico, diz o empresário. Pesquisa da Associação Brasileira de Defesa do Consumidor (Proteste) apontou custos de frete no Nordeste até 341% mais elevados do que no Sudeste. Dias avalia que o dado não refletiria precisamente a realidade no setor, mas aponta, como tendência, diferenças entre 30% e 40%, a depender do produto.

Na equação entre custos e tempo de entrega, prossegue Dias, o prazo tem maior impacto, afetando diretamente os resultados das empresas. Em média, no Estado de São Paulo, as entregas são realizadas em dois a cinco dias, atingindo 10 a 12 dias para a região nordestina. “A menor qualidade e o maior custo das entregas determinam um volume de vendas abaixo do potencial do mercado naquelas regiões”, afirma.

Resultado de investimentos de R$ 5 milhões desde a concepção do projeto em 2021 até seu lançamento em 2023, a QueroTruck espera faturar entre R$ 2,5 milhões e R$ 3 milhões neste ano, o primeiro em que a plataforma deverá operar plenamente na intermediação de operações de compra e venda de caminhões seminovos e implementos, diz Melodivo Teixeira, CEO da empresa. A plataforma oferece opções de equipamentos rodoviários a custos acessíveis. “A proposta é que nosso cliente compre mais e melhor para atenuar custos e despesas com manutenção de cavalo, carroceria, peças, pneus”, afirma Teixeira, otimizando gastos de forma geral, inclusive com diesel, considerando seu impacto elevado sobre o frete. “Os fretes são hoje o grande ‘agressor’ não só dos transportadores, mas de todo o mercado consumidor.”

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