Especial: Contratos de concessão do RS devem passar por mudanças para mitigar impacto da tragédia
Com o Aeroporto Internacional de Porto Alegre (Salgado Filho) ainda debaixo d’água e rodovias bloqueadas, os impactos das fortes chuvas para a infraestrutura do Rio Grande do Sul estão no topo da pauta de agente privados e públicos. Para mitigar a interrupção de operações, suspensão de cobrança de pedágio e danos estruturais, a expectativa é de que os contratos de concessões passem por mudanças, a exemplo do que aconteceu na pandemia da covid-19. Entre as alternativas, estão o aumento de tarifas, extensão do prazo de concessão ou alterações nos investimentos previstos inicialmente.
As operações no Aeroporto Salgado Filho foram suspensas no dia 6 deste mês após a pista e os terminais serem inundados. Segundo a Fraport, concessionária que administra o aeroporto, ainda não é possível estimar o prazo para a retomada dos voos nem o custo para reparar os danos, que ainda nem foram diagnosticados. Em nota, a concessionária afirmou, nesta semana, o que é possível discernir vendo as imagens do aeroporto: “somente após as águas baixarem” haverá condições de “avaliar em detalhes os impactos na infraestrutura aeroportuária”.
Desde o dia 5, a CCR suspendeu a cobrança em suas praças de pedágios após as chuvas provocarem diversos bloqueios nas rodovias sob a sua concessão. No entanto, os impactos totais seguem em análise.
Reequilíbrio provável
O processo de revisão das condições contratuais para lidar com efeitos externos é conhecido como reequilíbrio econômico-financeiro. “Na prática, isso significa readequar o contrato para as mesmas condições de quando foi assinado”, explica Paulo Dantas, sócio do escritório Castro Barros Advogados.
O especialista complementa que o caso do Rio Grande do Sul é “muito único”, apesar de já existir um histórico de reequilíbrios no Brasil. Dessa forma, cada concessão gaúcha precisará ser avaliada individualmente para identificar quais são os melhores mecanismos para repactuação.
Se por um lado há dúvidas sobre quais serão as estratégias utilizadas, por outro, é consenso entre os especialistas que a repactuação precisa ocorrer. “Os contratos preveem que em casos de força maior, como eventos climáticos, o risco é do poder concedente, abrindo espaço para o reequilíbrio”, segundo Fábio Falkenburger, sócio do escritório Machado Meyer Advogados.
Dantas relembra que durante a pandemia, as empresas eram obrigadas a comprovar como a crise sanitária afetava os negócios para negociar o reequilíbrio. “Já no caso do Rio Grande do Sul, o impacto é absolutamente concreto. Não tem muito o que discutir”, afirma. Neste cenário, o advogado espera que haja um esforço maior para que as negociações não sejam judicializadas.
Mecanismos
Alberto Valério, analista de transportes do UBS BB, também prevê a repactuação. Ele destaca que os mecanismos disponíveis para isso incluem aumento de tarifas, prorrogação do prazo para realizar os investimentos ou mesmo redução do aporte previsto em contrato. Há também a possibilidade do poder público entrar com capital ou permitir a extensão do tempo de concessão. “Pode também ser uma combinação dessas opções”, afirma.
Entre essas alternativas, Dantas considera o aumento tarifário o menos improvável e danoso do ponto de vista político. Em relação a um possível aporte do poder público, o advogado estima que o investimento viria do governo federal, já que o governo do Estado do Rio Grande do Sul passa por um momento crítico.
No caso do aeroporto de Porto Alegre, existe também a possibilidade de os recursos para a reconstrução virem do próprio sistema aeroportuário, de acordo com o diretor sênior da A&M Infra, David Goldberg. “O governo tem um alto grau de liberdade para fazer a conta fechar”, afirma. Com isso, a expectativa do especialista é que a concessionária e o poder concedente cheguem a um consenso para que a Fraport siga operando o aeroporto.
Falkenburger, do Machado Meyer, lembra que a Agência Nacional de Aviação Civil (Anac) foi uma das primeiras autarquias a fornecer o reequilíbrio diante dos prejuízos causados pela pandemia da covid-19 para os aeroportos. “Neste caso, além do aeroporto não estar operando, há também o custo da reconstrução que precisa ser discutido”, afirma.
Fraport e CCR
Valério, do UBS, e Goldberg, da A&M, destacam que a Fraport é considerada uma empresa de renome, com operações em diferentes países. Eles não consideram provável uma saída da empresa, que já conhece o mercado e investiu montantes altos no aeroporto.
A Fraport assumiu a gestão do Salgado Filho em 2028. Até 2023, investiu cerca de R$ 1,8 bilhão. O valor foi utilizado, especialmente, para reforma e ampliação do Terminal de Passageiros e ampliação da pista de pouso e decolagem, segundo a companhia.
Procurada, a Fraport afirmou que, no momento, está com as atenções voltadas para viabilização das operações na base de Canoas. “Ainda não é possível prever ou detalhar impactos financeiros na infraestrutura aeroportuária”, diz em nota.
Já a CCR afirma que tem trabalhado para “restabelecer o mais brevemente possível a segurança e fluidez das rodovias sob sua administração no Rio Grande do Sul”. Sobre o contrato, disse em nota que “dado o caráter de força maior das enchentes no Rio Grande do Sul, é esperado um processo de reequilíbrio econômico”.
Enquanto isso, a empresa acionou duas apólices de seguro. A primeira delas compensa os danos materiais. A segunda é de lucros cessantes, a ser acionada em função da suspensão da cobrança de pedágios.
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